quarta-feira, 29 de maio de 2013

Medos masculinos e mulheres obsoletas [Pondé]


Um amigo meu que apresentei a real extraiu do livro dele, parabens a toda galera que faz o trabalho de divulgação da real no facebook, fico feliz pois muitos conhecidos e amigos estão procurando, pesquisando e acordando para real graças ao trabalho de vocês.
Esse meu amigo é um. Fica ai o texto para analise dos amigos do forum.

3. Medos masculinos e mulheres obsoletas

Contra um mundo melhor

Ensaios do afeto

Luiz Felipe Pondé 

Ed. Leya

Este ensaio é uma breve reflexão do ponto de vista masculino acerca de algumas questões que afetam a relação entre homens e mulheres no momento contemporâneo. E, portanto, tudo começa com o chamado advento da emancipação feminina e o medo que ela causa nos homens que gostam de mulheres.

Não gosto do termo "emancipação", mas, como ele é de uso corrente, farei uso dele aqui.

"Emancipação", para mim, define-se em três etapas:

Partir de problemas reais. Por exemplo, submissão de algumas mulheres a maridos insuportáveis por falta de grana para mandá-los para o inferno ou impossibilidade de mulheres herdarem patrimônios, como era prática comum no passado. 
Solucionar esses problemas de modo eficaz. Por exemplo, divórcio, profissionalização definitiva das mulheres, nova legislação para proteção dos direitos das mulheres. 
Negar sistematicamente os efeitos colaterais indesejados causados pelas soluções dadas (item 2) aos problemas reais (item 1). Por exemplo, mulheres independentes financeiramente, mas sozinhas e desesperadas que se iludem dizendo "pelo menos hoje eu posso transar livremente com meninos de 20 anos sem dar satisfação para ninguém", mães solteiras e disfuncionais cotidianamente, repressão sistemática pela mídia ou intelectuais engajadas de qualquer discussão séria acerca desses efeitos colaterais indesejados, acusando-os de mera propaganda machista.

Interessa-me principalmente aqui o item três, principalmente naquilo que afeta diretamente os homens, que é quase tudo, porque, quando se é heterossexual, se é necessariamente dependente do que afeta "o outro", isto é, o sexo oposto. Experiência estranha ao homossexual que não ama o outro (hetero) sexo, mas sim o mesmo (homo) sexo. Os outros dois itens já me cansaram, seja pela verdade deles, seja pelo sono que me causam.

Sim, os homens estão de saco cheio das mulheres emancipadas. Mas não podemos transar com nossas avós, nem queremos. Há coisas a aprender com a emancipação das mulheres. Mas, para começar a aprendê-las, é necessário que possamos falar do assunto, e raramente falamos disso, até porque nossas mulheres têm o hábito de falar em nosso lugar mesmo quando dizem que querem nos ouvir. A capacidade feminina de enterrar qualquer conversa num sem-fim de detalhes é atávica.

Alguns darwinistas remetem essa capacidade feminina infinita para falar ao fato de que nossas ancestrais viviam coletando com suas crias e amigas e, enquanto isso, conversavam. Já nossos ancestrais, ocupados com a caça e o risco implícito na caça, precisavam ser silenciosos e focados na presa, logo, os que falavam demais eram mmalsucedidos e por isso sumiram na poeira dos inadaptados. Já para as fêmeas, a conversa era parte do cotidiano saudável, e, por isso, as silenciosas não tiveram sucesso, porque eram isoladas e antipáticas.

Por razões evolucionistas ou não, os homens são "travados", falam pouco e temem a intimidade consigo mesmos. Falta-lhes a "cultura da subjetividade", normalmente farta nas mulheres. Isso dificulta as coisas nos tempos de crise de identidade masculina, como a que vivemos.

O escritor americano Philip Roth, em seu maravilhoso Animal agonizante, diz que existem vantagens na emancipação feminina, mas dificilmente os melhores entre nós percebem. Essas vantagens têm a ver com a superação da eterna e falsa fragilidade feminina, arma mortal usada contra os homens que querem "cuidar" das suas amadas. Temos vergonha de ser fracos e não atendê-las em suas demandas. E essa vergonha é utilizada dia a dia, sem nenhuma cerimônia, pela quase totalidade das mulheres. Dizem que existem mulheres que não fazem uso desse "recurso", mas eu nunca conheci uma delas. Na troca de pneus, no enfrentamento de brigas, nas dificuldades financeiras, nos fracassos em geral, se repete o uso desse "recurso".

Segundo Roth, uma vez libertas das garras de uma sociedade que as impediria de crescer, as mulheres não mais poderiam se esconder atrás da fragilidade como destino feminino, mas sim alçariam altos voos por si mesmas e, assim, realizariam sua força até então reprimida. E aí entra a vantagem: os homens poderiam abandoná-las a sua sorte de solitárias livres quando se cansassem delas sem sentir culpa por suas misérias de mulheres abandonadas. Desse modo, estaríamos todos livres e solitários.

O primeiro problema é que, assim como a dominação muitas vezes é erótica na cama (ouvi-las gemer sob a força do sexo que as penetra é uma delícia), a dependência feminina sempre seduziu a maioria esmagadora dos homens. A dependência feminina sempre foi, no plano mais sofisticado da química entre os amantes, uma manipulação da qual o homem só escapa quando não ama a mulher. A única libertação seria a indiferença. Todo homem casado que ama sua espoosa sabe que ela é quem manda na relação cotidiana: escolhe mesas em restaurantes, decide quais amigos vão ao cinema, manda em suas roupas, escolhe a casa em que vão morar, a cor das paredes, controla seus silêncios, interpreta seus sonhos. Engana-se quem supõe que detalhes assim não tecem a vida e contaminam a alma das pessoas. Uma mulher lhe diz se você é vencedor ou derrotado. Quando um homem cansa de obedecer, ele vai embora. Quando ele já não teme o que ela sente ou pensa, ela já está só.

Sim, eu sei que isso pode ser visto como mera retórica machista: as mulheres podem mandar em casa, no microcosmo (diria La Beauvoir em seu Segundo sexo, bíblia feminista), mas os homens mandam no espaço público. O problema é que o amor não se dá no espaço público, e os homens cansam sim do "pequeno" poder feminino (que nada tem de pequeno) em seu cotidiano microscópico. Com o impacto das mudanças nas vidas das mulheres e dos homens nas últimas décadas, esse cotidiano microscópico passou a sofrer de novas agonias: quais os papéis sociais de homem e mulher? Ao final, a sutil dominação feminina sobre a alma masculina era o preço a pagar por sua infinita doçura hoje morta.

Mas deixe-me dizer um segredo, minha bela leitora: neste ensaio pouco me importa o que você ou qualquer outro argumento feminista queira dizer. Desta vez, eu falo, e você ouve. Isso, claro, se você quiser ter alguma chance de escapar dessa cama solitária na qual você se deita todas as noites porque os homens ou bem têm medo de você e de seu sucesso e (pretensa) segurança, ou bem a acham uma chata que fala demais e (pensa) que sabe demais. Quem sabe posso ajudá-la a entender a "alma masculina" que algumas de suas amigas mais nervosas estão prestes a varrer do mundo, civilizando-a até a morte.

Não pense que, porque dormimos quando vocês querem discutir a relação, isso implica que não sabemos do que vocês falam. Levem a sério o nosso tédio com o que vocês dizem. Ele fala da descrença (e do desencanto) que a experiência com o mundo prático gera com relação às palavras e também fala acerca de alguns medos essências que temos.

Quais são esses medos?

Antes de tudo, segure a respiração porque sei que você se apavora só em pensar que os homens têm medo de alguma coisa. A sensibilidade masculina a desorienta. Você só gosta dela nos filmes e nos carinhos no sexo. No fundo, você quer o monopólio da sensibilidade para você. E quer o mesmo homem de sempre (seguro, sólido, sem dúvidas), só não quer sentir-se submetida a ele.

Mas os homens têm sido empurrados para a sensibilidade e para a cultura da subjetividade. Talvez sempre fôssemos capazes disso, mas a vida tal como era nos poupava ou impedia. Agora nos afogamos em palavras que não dominamos.

Mesmo com toda a conversa da modernidade, os homens permanecem presos ao sentimento de que devem sustentar suas mulheres (quando de fato as querem para valer), e as mulheres também querem ser sustentadas. Podemos dizer que isso é cultura (isto é, poderia ser mudado via reeducação contínua) ou natureza inata (difícil de mudar). O problema é que sentimos que tudo que queremos (atenção, cuidados, delicadeza, dedicação, "a janta") é opressão para as mulheres, enquanto tudo o que caracteriza o desejo da mulher (ser meio paranoica com tudo, exigir mil coisas, ou mais, para se sentir amada suficientemente, fazer-nos esperar por elas, sermos capazes de saber de antemão o que elas querem que saibamos, darmos presentes todos os dias) é direito da natureza feminina. Este é um nó que, com o tempo, desgasta a relação no cenário cotidiano.

O sentimento é de exigência sem fim. Mas, por outro lado, não podemos exigir nada porque, de repente, acende a luz vermelha da "opressão sobre a mulher".

Em sala de aula, quando discutimos questões assim, entre alunos de 20 anos, mais ou menos, a queixa masculina é sempre esta: temos que ser sensíveis, temos que ser durões (a própria metáfora física da potência sexual aponta para isso), temos que ser compreensivos, companheiros, mas…, mas se chorarmos, se perdermos o emprego, se ficarmos tristes, já era… As mulheres são absolutamente insensíveis a qualquer sofrimento masculino que dure mais do que cinco minutos. Casamentos não resistem ao fracasso masculino, homens deprimidos são sistematicamente abandonados, enquanto mulheres deprimidas reconstroem a vida todo dia. Homens reconstroem suas vidas mais facilmente quando se casam de novo com outras mulheres mais jovens, mas dificilmente homens deprimidos casam de novo, comumente são recusados por outras mulheres porque quase sempre a depressão masculina vem junto com perda financeira e perda de saúde, e mulheres, normalmente, não suportam homens fracos e sem dinheiro. Mulheres deprimidas saem mais facilmente da depressão, muitas vezes sem ter o seu casamento original danificado.

O que homens de 20 anos sentem é que não há Plano B para eles. Casamento e paternidade não são suficientes nem para eles como sucesso masculino, nem para suas namoradas. É comum, nesta dita era pós-moderna, ouvirmos mulheres discutirem opções como "quero trabalhar, mas não tanto que ponha em risco a maternidade". Ou discutirem opções profissionais "que estejam em sintonia com sua energia pessoal". O homem sente que isso não existe para ele. Não há opções a não ser o sucesso profissional que deve sustentar todo o resto, mesmo que esteja vivendo com uma mulher emancipada e bem-sucedida. O único ganho real do homem com a emancipação feminina, como diz Roth, é poder abandoná-la à sua sorte sem culpa. E os melhores entre nós nunca fariam isso.

Nada mudou no mundo, tirando o fato de que nós perdemos todos os "direitos" que tínhamos.

Essa realidade, essa sensação de injustiça cometida contra os homens, produz comportamentos de baixo investimento afetivo porque muitos de nós caímos na fobia. Medo de investir e receber de volta uma petição de direitos que vai do direito de deixar a cozinha vazia até o de deixar a cama desinteressante e o afeto desorientado, mas com a manutenção da exigência de alta renda por parte dos homens. Isso nos estimula à canalhice por razões "sociopolíticas": hoje em dia a mulher tem não os mesmos direitos, mas mais direitos, logo, de mim, elas não tirarão nada". O cinismo, como sempre, aparecerá na sua face profunda: ressentimento agressivo.

Algum tempo atrás, uma aluna num curso em que as pessoas eram velhas (tipo 40 anos, mais ou menos) fez um desabafo: "os homens me punem porque sou emancipada". Minha cara, os homens não punem você. Eles têm medo e ressentimento porque sabem que não têm nenhum direito diante de sua infinita insatisfação (traço eterno da mulher), nem diante (depois das últimas décadas) da sociedade, porque não querem o horror de ser chamados de machistas. O resultado é a fuga.

Com o passar dos anos, os homens envelhecem e mudam, e também o seu olhar sobre as mulheres. Pior ainda se pensarmos em homens mais inteligentes e exigentes. Não, não basta "trazer uma cerveja e vir pelada". O problema é que as mulheres, na realidade, apesar de dizerem que buscam homens mais inteligentes e exigentes, não estão preparadas para isso quando encontram. Para além das fantasias da empregada, da enfermeira e da colegial, queremos sutileza e pouca preparação. Mais espontaneidade e menos obviedade. Não acredite na história de que somos gorilas com pouco pelo. O homem busca menos controle sobre o que pensam e sobre o que devem fazer para serem vistos como "bons companheiros". As regras da civilização da emancipação fazem a mulher ficar excessivamente desinteressante e interesseira.

A filosofia, a sociologia, a antropologia e a psicologia muitas vezes apenas atrapalham. A filosofia idealiza, fazendo-nos pensar que o amor seja mais do que é – banal, passageiro, incoerente. A sociologia contamina o amor com suas bobagens foucaultianas: dar um presente para uma mulher é assediá-la, querê-la dominada sobre uma cama, machismo atávico ou falocentrismo. A antropologia relativiza tudo, fazendo o amor romântico ser mais uma mania, como comidas ou bebidas típicas, ou mera invenção da literatura ocidental. A psicologia nos obriga a levar Freud para a cama, faz da paixão um sintoma. Você não é apenas você, você é sua classe social, sua cultura, seus traumas, suas ilusões e idealizações. Informação demais atrapalha. Torna a ação confusa, insegura, desorienta o que em nós é hábito.

A grande metáfora da condição masculina, independentemente de qualquer blá-blá-blá moderno, é: diante de uma mulher carregando algo pesado, se você não carregar para ela, é um mal-educado, um covarde, um fraco. Mesmo que ela seja "culpada" por tentar transportar algo com peso acima de sua capacidade, ao homem ainda é negada a possibilidade de dizer "não". Quando amamos, carregamos tudo com felicidade. Se o peso for exagerado, morreremos, mas não desistiremos de carregá-lo se amarmos a mulher que está do nosso lado. Normalmente, antes de tudo, morrerá o amor por ela.

Talvez o resumo da ópera seja: o homem precisa aprender a dizer "não", assim como a mulher aprendeu. Ela diz "não" para a cozinha, para a maternidade, para a virgindade, para a fidelidade, sob as palmas da cultura pós-moderna. Como uma liberta das amarras do passado, ela caminha solta em meio aos escombros de seus velhos papéis sociais. O homem precisa aprender a dizer "não" para a mulher que se oferece sexualmente, para a suspeita sobre ele lançada de que não seja capaz de sustentá-la (em todos os sentidos da palavra), para a obrigação de estar sempre presente quando ela desperta de seu sonambulismo emancipado e volta à atávica cobrança de sempre.

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